Pense aí o que você estava fazendo quando tinha 17 anos: para quem é nascido ou nascida nos anos 40, 50, 60 e 70, não era incomum aos 17 anos dividir o tempo entre estudar e já trabalhar em algum negócio da família ou fazendo uns bicos aqui e ali para conseguir um dinheirinho. Agora, mesmo nessas décadas, pouco se via um adolescente comprando uma empresa com o próprio dinheiro. O adolescente em questão era Orlei Roncaglio, diretor da Gráfica e Editora Kaygangue, de Palmas, que acaba de completar 40 anos de atividades como uma gráfica em pleno crescimento.
A empresa comprada por Orlei, em maio de 1981, era uma pequena tipografia desativada na cidade de Salto do Lontra-PR, que imediatamente após a compra, foi transportada e montada em Mangueirinha-PR. E, se causa surpresa saber que um menino de 17 anos se tornou empresário gráfico, surpreende mais ainda saber que ele já tinha sete anos de experiência no setor. Isso mesmo, aos dez ele já lidava com tipografia em Chopinzinho-PR, sua cidade natal. “Nessa época criança podia trabalhar. Me apaixonei pela profissão, e estou até hoje. Eu fazia de tudo na tipografia. Houve um período em que ficava o dia na empresa, ia para a escola a noite e depois ainda voltava ao trabalho para adiantar tarefas do dia seguinte. E eu gostava muito daquilo”.
Mas é provável que você esteja pensando: “ah, na verdade os pais devem ter comprado a gráfica para ele”. E aí surge outro fato impressionante. O dinheiro para empreender veio da venda de um Fiat 147 que Roncaglio já tinha comprado com o salário que juntou nos anos em que foi funcionário na gráfica Chopim, em Chopinzinho. “Eu também já dirigia quando era adolescente e tinha esse Fiat 147, que era o meu segundo carro, pois tive antes um Chevette. Dei o 147 como minha parte para comprar a gráfica em sociedade com o Sr. Valério Milesi Dalmutt, que ficou uns três anos no negócio. Depois acabei adquirindo a parte dele”.
Nos primeiros anos, a gráfica funcionava em um espaço de 25 metros quadrados, o qual Orlei também usava para dormir(a noite arredava a escrivania para baixar a cama que estava escorada na parede, pela manhã invertia o processo), já que a casa de seus familiares ficava em Chopinzinho. Em 86, ele construiu uma sala com 60 metros quadrados para instalar a Gráfica. Em 90 constriu um prédinho com apartamento em cima, onde morava, e duas salas embaixo, uma para a gráfica, que ocupava 130 metros quadrados, e outra em que funcionava a papelaria.
A essa altura, a veia empreendedora de Roncaglio já pulsava a ponto de fazê-lo avaliar que Mangueirinha não daria conta dos planos de crescimento que traçava para a gráfica. “Como a cidade era pequena, não daria para expandir os trabalhos, por isso comecei a prospectar clientes em Palmas, que contava com mais que o dobro de habitantes. Nessa época, eu já possuía uma offset e conseguia me destacar porque na cidade vizinha só havia tipografia. Em pouco tempo, 65% do meu faturamento já vinham de Palmas e aí se tornou inevitável a mudança da gráfica para lá, o que aconteceu em 94”.
Nessa mudança para Palmas, Roncaglio levou todos os funcionários, na época sete famílias, pois sempre tratou os funcionários como uma família e todos quiseram acompanhar a empresa.
Mudança de rumo
O crescimento da empresa se deu com a aposta em máquinas para impressão de formulários contínuos para produção de nota fiscal, atendendo clientes do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul e outros estados. Com as vendas em alta, em 2001 a Kaygangue ganhava uma sede própria de 3 mil metros quadrados, onde está até os dias de hoje. Tudo ía muito bem até 2010, quando surgiu a nota fiscal eletrônica, que aniquilou o mercado de notas em formulários contínuos. Motivo para Orlei desistir de tudo? Que nada. “Tivemos que nos reinventar e decidimos atuar com os segmentos comercial e promocional. Investimos em máquinas de pequeno porte, compradas à vista, e em algumas maiores, financiadas em cinco anos diretamente com os fabricantes internacionais.
A guinada no ramo de atuação deu certo, mas não seria a última. Em 2018, contrariando as tendências de mercado, que apontavam para o declínio do segmento editorial, Orlei passou a investir forte justamente nisso, mantendo ainda o promocional e deixando de lado o comercial. “Ouvíamos todos dizerem que o digital iria tomar o lugar do editorial, mas calculamos todos os riscos e decidimos apostar. Algumas editoras grandes estavam fechando e vislumbramos que haveria mercado para ser atendido em livros, apostilados e revistas em pequenas e médias tiragens. Fizemos investimentos planejados em maquinários, usamos nossa tradição de força de vendas comercial externa e interna e acertamos na veia. Com a pandemia do coronavírus, as pessoas passaram a ficar ainda mais em casa e a lerem mais livro físico, que, segundo pesquisas, teve mais vendas do que os digitais desde o início da pandemia. Isso, lógico, nos favoreceu e acabou impulsionando ainda mais o crescimento da Kaygangue. A decisão de entrar no editorial foi tomada em conjunto por todas as áreas da empresa, com um grande empurrão do meu filho Vinícius Roncaglio, que cuida da área comercial e que se criou praticamente dentro da empresa”.
E Orlei fala com orgulho do filho: “Vinícus fez curso no Senai Theobaldo de Nigris, em São Paulo, onde passou por diversos setores produtivos para aperfeiçoar o que já havia aprendido na empresa e adquirir novos conhecimentos. Hoje como sócio da empresa, nos ajuda nas tomadas de decisões. Sou muito grato e tenho muito orgulho dele”.
Segundo Orlei, o editorial vem contribuindo muito para a empresa superar rapidamente as perdas com a pandemia. Se entre março e junho de 2020 houve queda de mais de 50% no faturamento, a partir de agosto as contas já se equilibraram e a Kaygangue até fechou o ano com aumento nas vendas e no faturamento. “Recuperamos tudo e até melhorou. Todos os meses temos batido as metas. Aproveito para destacar também a força do time comercial e de representantes nos três estados da Região Sul. Essa rede de vendedores responde por 50% do faturamento total hoje. Claro que tudo isso porque sempre investimos em qualidade e em ótimo atendimento”.
Orlei planeja continuar firme com o editorial, mas já estuda a próxima mudança de rota no mercado. “Estamos investindo em máquinas para acabamento de livros e revistas e vislumbramos que esse segmento ainda vai bem por uns dez anos. Mas já estamos de olho no digital e também em flexografia. Nosso próximo movimento poderá ser nessas áreas”.
Aposentadoria adiada
Força e coragem para novas mudanças não faltam à Orlei. Hoje com 58 anos, já era para ele ter parado e dedicar mais tempo a ele mesmo e à família. O plano era ter diminuído o ritmo de 14 horas de trabalho diário e passado o controle da empresa aos filhos quando chegou aos 50 anos. No entanto, adiou a aposentadoria porque foi justamente nesta época que precisou liderar a transição dos formulários contínuos para os segmentos promocional e comercial.
Mas você pensa que Orlei ficou chateado por não ter conseguido parar ainda? Que nada. “Na verdade eu ainda sinto o mesmo tesão pelo trabalho que tinha aos 17 anos, como comecei no ramo gráfico. Hoje tenho dividido muito a responsabilidade com o filho Vinicius e tentado evitar de ir à empresa no sábado e no domingo, mas no dia a dia da semana no mínimo 12 horas de trabalho são sagradas”.
Nas horas em que não está na Kaygangue, Orlei ainda dedica um tempo às atividades associativistas, como reuniões no Sigep/Abigraf-PR, FIEP, Sicredi e em outras entidades. Nos fins de semana e em datas especiais, ele se permite deixar a preocupação profissional de lado para se dedicar ao que ele chama de terapia, que é cozinhar. O prato preferido é tainha recheada com a ova dela mesma. Se fica bom? Orlei responde. “Os familiares e amigos elogiam e pedem para fazer novamente. É um prato que rompeu as fronteiras de Palmas, já preparei o prato em vários locais, mas sempre pra amigos e conhecidos.
O diretor da Kaygangue diz que não foi porque ele gosta de cozinhar, mas o tema culinária pautou a comemoração dos 40 anos da empresa. “Geralmente fazemos uma grande festa em 1 de maio, com funcionários e familiares. Este ano, por conta da pandemia e para não deixar de comemorar os 40 anos, essa festa foi online. Os funcionários receberam um kit com a receita e os ingredientes para se fazer um risoto de palmito, além de uma garrafa de vinho. Aí marcamos uma live, com apresentação de um vídeo sobre a empresa, e todos puderam mostrar os pratos que tinham feito, cada um do seu jeito, sem regras. Também foram postando nas redes sociais e no grupo de todos os funcionários e diretoria da Kaygangue. Foi uma maneira criativa de envolvermos e agradecermos a todos os colaboradores, que formam essa grande família Kaygangue, e de não deixarmos passar em branco os 40 anos da empresa”.
Kaygangue
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www.kaygangue.com.br